domingo, 6 de abril de 2014

Cidade em Portugal lucra com fama de 'terra dos dinossauros'

Lourinhã, a 50 km de Lisboa, recebe 25 mil visitantes por ano, a maioria deles para ver de perto seus fósseis pré-históricos.

Octavio Mateus cuida do museu de Lourinhã, que tem uma importante coleção de fósseis jurássicos (Foto: BBC)

A descoberta recente em Portugal do que cientistas acreditam ter sido o maior predador que já viveu no continente europeu colocou mais uma vez em evidência uma pequena cidade conhecida como a "terra dos dinossauros".

Também é o mais novo capítulo do verdadeiro "conto de fadas" que começou quando um garoto de nove anos descobriu um imenso dente de dinossauro. Hoje ele lidera um projeto de pesquisa cujas descobertas viraram manchete em todo o mundo.

Em um laboratório repleto de fósseis, Octavio Mateus segura um dente do tamanho de uma adaga da nova espécie, bem parecido com aquele que encontrou quando era criança.

"Nesse dente em forma de lâmina, você pode ver claramente as serras - era um predador feroz", ele explica. "Compare isso com os dentes do Tirannosauro Rex, que pareciam bananas - bem arredondados e adaptados para esmagar ossos - enquanto esse foi feito para dilacerar carne."

"Isso mostra duas estratégias diferentes de alimentação na evolução destes animais, mesmo que aparentemente eles sejam parecidos."

Hoje, aos 38 anos, Mateus é professor na Universidade Nova, em Lisboa, onde leciona no primeiro curso superior de paleontologia do país.

Mas ele ainda passa muito tempo no museu de Lourinhã, a 50 quilômetros ao norte da capital Lisboa, onde, há 30 anos, seus pais ajudaram a fundar o local que guarda várias descobertas arqueológicas e etnográficas.

Tesouro jurássico

Os fósseis deram uma identidade a essa pequena cidade no interior de Portugal (Foto: BBC)

Ironicamente, a seção paleontológica estava em segundo plano. Atualmente, foi expandida e atrai por ano cerca de 25 mil visitantes à cidade, que tem 7 mil habitantes.

A verdade é que Lourinhã tem apenas dois motivos para ser famosa. A área é uma das únicas três do mundo reconhecidas como produtoras de conhaque (as outras, mais famosas, são Cognac e Armagnac, ambas na França), e suas rochas são, graças a sua geologia e acessibilidade, um tesouro de fósseis da era jurássica.

Conforme as descobertas se multiplicaram e a exposição do museu aumentou, seus habitantes tornaram-se ainda mais orgulhosos de sua herança única.

Os negócios em Lourinhã normalmente têm a palavra "dino" em seu nome, e muitas logomarcas exibem um desenho de uma destas bestas extintas. Em um café, um enorme osso de uma perna destes animais fica, como um pilar, ao lado de um balcão de doces.

Placas de boas-vindas na entrada da cidade exibem um dinossauro. Os animais também estão presentes em muitos produtos vendidos por lá.

Tudo isso tem uma razão. Seu museu tem uma das mais importantes coleções de fósseis do período jurássico superior no mundo.

Lou-Octavia Morch, uma estudante de arte que está dividida entre se especializar em desenhos arqueológicos e paleontológicos, diz que Lourinhã é ideal em ambos os casos. Isso graças às ruínas de uma necrópole próximas dali e por outros locais antigos, além de, claro, seus famosos fósseis.

"É inspirador", ela diz enquanto desenha um crânio humano como parte do período de dois meses que passará no museu. "Poderia ficar anos aqui."

Assunto de família

A paleotologia em Lourinhã é um assunto de família. O pai de Octavio, Horacio, fundou o museu. Seu irmão Simão guia com entusiasmo os visitantes e recentemente terminou um mestrado em museologia. Sua irmã Marta também trabalha como voluntária.

Simão, que também escreve e ilustra livros infantis sobre dinossauros, forneceu os desenhos publicados no estudo mais recente de Octavio.

Os itens relacionados a dinossauros em exibição vão desde esqueletos completos a um ninho fossilizado com dúzias de ovos. O ninho foi apenas uma das muitas descobertas feitas pela família Mateus em suas expedições que, para Octavio, começaram quando ele ainda era bem pequeno.

"Nasci praticamente em um ninho de dinossauro", ele diz brincando.

Poucas pessoas podem dizer que, quando crianças, escavaram tantos fósseis e descobriram espécies inteiras, como é o caso dele.


Lourinhanosaurus

É comum encontrar referências a dinossauros no comério de Lourinhã (Foto: BBC)

Um dos dinossauros que podem ser encontrados no museu é o predador Lourinhanosaurus, identificado como uma nova espécie pelo próprio Mateus quando ele ainda estudava biologia na faculdade.

"A espécie recebeu o nome da cidade, o que para nós foi muito icônico", ele afirma.

Ao longo de sua carreira de pesquisa, Mateus não só continuou a fazer grandes descobertas em Portugal, como também encontrou os primeiros dinossauros de Angola e da Bulgária.

Sua última expedição foi à Groenlândia como membro de uma equipe que descobriu fósseis de dois phytosaurus - grandes répteis similares a crocodilos, mas da era triássica, há 200 milhões de anos.

Mas o museu de Lourinhã, onde Mateus passa horas em seu laboratório preparando fósseis, é claramente um lugar especial para ele.

Nas seções paleontológicas, está pendurado um grande crânio fossilizado de um dinossauro que ganhou o nome de Torvosaurus gurneyi graças a um estudo publicado por Mateus e seu colaborador em Lisboa, Chritophe Hendrickx.

Senso de comunidade

Para a cidade, as bestas extintas trouxeram fama e um forte senso de comunidade.

"O museu dá uma identidade a Lourinhã", diz Octavio. "As pessoas vêem a si mesmas nos dinossauros".

O museu é um empreendimento comunitário, em que todos, do diretor à secretária, trabalham de graça, o que o torna autossustentável. O conselho da cidade financia um quinto de seu orçamento - o que parece ser um ótimo investimento.

"Não seria possível de qualquer outra forma ter o nome do município divulgado tão amplamente", destava Octavio. "O nosso conhaque é considerado um dos melhores do mundo, mas os dinossauros têm um grande impacto."

Fonte: BBC e G1

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